agosto 10, 2008

AS DESVENTURAS E O GENGIBRE

Infelizmente, aquela foi uma daquelas semanas que, se não existisse na nossa vida, não faria nenhuma falta. Não adianta dizer que tudo é um aprendizado, que problemas nos fortalecem e que cada um carrega a cruz que pode suportar.
Naquele semestre, eu trabalhava no município de Dois Irmãos, em Sapucaia do Sul, Gravataí e Porto Alegre. Meu dia de menor movimento era sexta-feira, pois eu apenas lecionava em Dois Irmãos no turno da tarde e encerrava minha semana de trabalho. Aquele era um final de semestre cansativo, como vários passados por qualquer pessoa normal. O fato de estar trabalhando em quatro municípios diferentes não piorava a minha situação.
Desgastado pela correria, fui para Dois Irmãos para encerrar minha semana, quando no meio do caminho, meu carro começou a aquecer demais. Tive que pará-lo no meio da estrada e aguardar por um socorro que demorou 1h30 para chegar e veio pelas mãos de um mecânico que fazia rondas pela BR-116 para “auxiliar” aqueles que precisavam.
Ele informou que um “selo” do radiador tinha furado e que era preciso trocá-lo. Sem alternativa, aceitei o serviço. O pagamento pela peça, mão-de-obra e socorro foi muito mais salgado que o esperado, mas não havia outro jeito. Infelizmente, não havia mais tempo para lecionar e isso me deixou muito irritado.
Somado o cansaço do final de semestre com o fato inédito de ter ficado um tempão numa rodovia, esperando por um socorro incerto, resolvi “fugir” um pouco dos problemas e passear pela serra. Viajar sempre me fez bem e eu acreditava que dessa vez não seria diferente.
Depois do agradável percurso até Gramado, acompanhado pela minha então namorada, procurei por um restaurante para almoçar. Ao reduzir a velocidade para passar por uma lombada, fui surpreendido por uma colisão na traseira do meu carro por uma Brasília caindo aos pedaços. Imediatamente, imaginei que jamais receberia o dinheiro pelos danos causados. Para a minha sorte, o motorista era funcionário de um famoso café colonial e me informou que o proprietário pagaria a despesa, sem problemas. Depois de um orçamento superficial, cobrei pelos danos da forma mais justa possível. Se eu tivesse algum prejuízo, já seria lucro, pois não esperava receber nada.
Aborrecido com o fracasso da minha saída, resolvi retornar a Porto Alegre, e me esquecer do mundo. A chuva de final de semana era própria para o meu desânimo.
As aulas de segunda-feira começavam apenas no turno da noite e, quando cheguei no estacionamento do meu prédio, vi o vidro traseiro do meu carro quebrado e o painel completamente destruído. Além do prejuízo, o carro estava cheio de água.
Diante de tantos problemas seguidos, resolvi caminhar sob a chuva para “arejar” as idéias. Caminhei por várias quadras, até que o horário me obrigou a pegar um ônibus para não me atrasar. Chegando em sala de aula, trabalhei como se nada tivesse acontecido. Os alunos apenas estranharam o fato do meu blusão estar pingando e eu não ter tirado. (nem havia percebido). Banho de chuva, sala de aula abafada e professor de História falante resultaram em uma rouquidão imediata.
No dia seguinte, uma aluna me ofereceu gengibre, dizendo que era um “santo remédio” para a garganta. Mesmo sem conhecer a iguaria, agradeci com o entusiasmo de quem estava esperando por essa solução. Esperei até o intervalo, sem saber o que fazer com aquela raiz. Descasquei o gengibre e deu uma mordida, como se fosse uma maçã. Péssima idéia. Meus lábios amorteceram imediatamente e uma lágrima rolou pelo meu rosto.
Aquele gosto me fez perceber que Schopenhauer tinha razão quando dizia que “nada é tão ruim que não possa ficar pior”. Depois de tantos problemas, a minha história encerrava com um singelo gosto ardido, mostrando que os problemas se resolvem facilmente.

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